MOCHILANDO NA TRANSPANTANEIRA Imprimir
Seção: Técnicas - Categoria: Lateral
Escrito por Jorge Soto   
Qui, 04 de Junho de 2009 21:56

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MOCHILANDO PELO PANTANAL MATOGROSSENSE

 O único que sabia do Pantanal se limitava à antiga novela homônima. No entanto, esta vasta região é muito + do q pano de fundo p/ qq folhetim p/ gringo ver. É uma terra onde as águas ditam o curso da vida selvagem, q pode ser apreciada em seu estado mais puro e exuberante.

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      alagados  sem fim                                                            aguapés na estrada

um verdadeiro zoológico de biodiversidade a céu aberto, num ambiente q é transição do cerrado p/ floresta amazônica. E o Pantanal Norte parecia ser uma ótima pedida p/ viver, mesmo q brevemente, esta experiência de rusticidade longe do conforto dos resorts/refúgios gringos q pululam em sua porção sul, porem igualmente repleta de atrativos.

A manha estava tomada pela neblina qdo o busao deixou a simpática Chapada dos Guimarães c/ destino Cuiabá. Eu ainda decidia q rumo tomar, de acordo com a disponibilidade de busao p/ qq cidade próxima do Pq das Emas, centro-sul do estado. Dong, o coreano q conhecera no camping, tinha um esquemão numa fazenda no Pantanal e me convidara a dividir despesas. Fiquei de pensar. 8hrs, já na rodô potiguara, a inviabilidade de horários de busao p/ centro-sul do estado decidiu p/ q acompanhasse meu amigo. Afinal, depois de me matar caminhando no "Centro Geodesico do Continente" nada melhor q um pouco de mordomia desta vez. Fiz as contas e cabou dando menos de 200 pilas por cabeça. Beleza, tava dentro do meu mirrado orçamento.
Dong fez as devidas ligações (conseguidas c/ um mochileiro italiano) e meia-hora depois aparecia uma Kombi p/ nos buscar na rodô. João era o dono da fazenda, foi com quem negociamo$ e depois não vimos mais. Marcos, o motorista, era o pantaneiro q seria nosso "anfitrião" durante nossa breve estadia. Atravessamos a cidade, simples e de pouca verticalidade, c/ destaque pros orelhões coloridos c/ formatos de bichos pantaneiros. Boa parte das ruas nem tem placa de identificacao. Algumas compras e partimos em direção a Poconé,100km dali, numa estrada q rasgava a enorme planície verde q se abria diante de nós.

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figurinha carimabada na região                       vem pegar tóto, vem 

PELA TRANSPANTANEIRA

Em Poconé, 9:30, cidadezinha minúscula c/ ares interioranos, mais uma breve parada. Tava um calor desgraçado (quase 40ºC) e o sol forte destoava a arquitetura colonial da cidade, de cores claras vivas q outrora viveu do garimpo de ouro. Pé na tabua e não tardou o asfalto dar espaço p/ terra batida. Dali ate a fazenda seriam 50kms bem demorados. Após um tempo por uma estrada vicinal chega-se diante de um posto do Ibama, onde militares (!?) policiam diante uma placa de madeira c/ os dizeres "Transpantaneira - aqui começa o pantanal matogrossense", escrito tb em espanhol e inglês. Esta estrada vai ate Porto Jofre (no Rio Cuiabá, a 147km), embora originalmente fosse construída p/ ir ate Corumbá. Isto é, os caprichos da natureza fizeram desta estrada ligar o nada a lugar nenhum, em tese.
A partir dali é um retão de terra batida, precário e interminável, atravessando uma gigantesca planície alagadiça de vegetação aquático-arbustiva. A visão impressiona. Água, água e mais água, onde quer q se olhe. Isso pq na época chuvosa td água escorre dos planaltos p/ cá, alem dos próprios rios transbordarem seu leito. Uma planície coberta por uma imensidão de águas, onde apenas alguns focos de matas e arvores maiores - bem ao longe - contrastam c/ a horizontalidade da paisagem, permanentemente alagada.
Na verdade, a Transpantaneira não passa de um aterro elevado sobre o charco, repleta de pequenas e rústicas pontes de madeira (+ de 100). Em alguma delas nem o motorista confia e opta por contorna-las por aterros q atravessam pela água mesmo. A Kombi chacoalha muito e Marcos mesmo assim pisa fundo, desviando dos enormes buracos, pedras soltas e terreno arenoso q as vezes toma conta do caminho. O consolo é a paisagem, q mesmo sendo período de seca se mostra uma megacharco, um campão gigantesco tomado pela água apresentando alguns e raros pontos secos, nas áreas mais elevadas. Noutros trechos o alagamento é forrado por um tapete verde de aguapés, plantinhas típicas daqui q flutuam em conjunto, emoldurados por matas maiores, bem ao fundo. Aqui é o único local onde as inundações são bem vindas.
Evidentemente, a estrada passa por algumas entradas q levam a fazendas da região, q basicamente se dedicam a pecuária. Mas não demora e a vida selvagem começa a surgir, indo alem dos cavalos e búfalos de praxe. Famílias de capivaras correm p/ água c/a passagem do veiculo; jacarés imoveis c/ a cabeça empinada nas margens do aterro já parecem indiferentes; os postes ostentam enormes ninhos cheios de verdes maritacas em seu interior; e as águas desfilam toda sorte de aves, uma mais bonita q a outra. Biguás, araras, martim-pescador, marrecos, garças, carcarás, gaviões, tucanos, etc..Uma pequena parada p/ bater fotos e qual minha surpresa q os jacarés todos se escondem em meio os aguapés, nifeias e belas vitória-regias, ariscos. Mas pude reparar q a água é bem clarinha, embora relativamente escura noutros trechos. Apesar do calor e da proximidade de água fresca p/ banho estar disponivel, o bom senso evidentemetne proíbe qq espécie de imersão
De repente, vemos de longe na estrada um vulto escuros rodeado de gdes aves, q se dispersam à nossa aproximação. Eram urubus bicando uma capivara fresquinha, recém-atropelada. É triste contatar q isso é comum aqui. Contabilizei + 2 capivaras, um jacarezinho e varias cobras de gde porte vitimas da imprudência humana, isso somente no curto trajeto q percorremos.
Durante td o sacolejante caminho cruzamos com apenas um veiculo sentido contrario, indicando q a densidade demográfica humana aqui é baixíssima. Estudei atentamente alguma possobilidade de camping no trajeto e reconehco q não vi viabilidade nehuma p/ tal. Uma rede quiçá fosse viável, mesmos sujeito a alguns riscos. Diga-se onças.
A viagem nos toma + de 2 horas e, numa placa anunciando "Fazenda Rio Claro", saimos da Transpantaneira p/ adentrar noutra estrada secundaria, onde sacolejamos mais um pouco ate pararmos diante de um descampado rodeado de muita mata.


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Jaburú                                                       Piranho e Piranha

ENTRE JACARÉS E PIRANHAS (O PEIXE)

Aqui deixamos a Kombi onde 2 outros peões nos aguardavam a cavalo, pois a partir dali a estradinha tava um atoleiro só. Eu e o Dong montamos nossos cavalos, enquanto os peões levavam nossas mochilas numa carroça. Nunca tive jeito p/ cavalos mas aqui (re)descobri q montar não é tão difícil assim. O dose foi ver q o bichinho tava cheio de feridas provocadas por um moscão hematofago, deixando varias marcas de sangue coagulado no dorso. Era quase meio-dia.
Menos de meia-hora depois já nos encontrávamos propriamente na Fazenda Rio Claro, um casarão bem simples cercado das casas dos peões, às margens do rio homonimo. O pantaneiro é um tipo de vaqueiro, peão, q toca o gado p/ áreas de pastagens de acordo como regime das cheias. Atualmente, alem do gado, se incumbem de adaptar as fazendas a receber turistas, atividade rentável p/ eles. No caso, Marcos era o "pantaneiro-mor", tocava a fazenda na ausência do dono. No casarão, conehcemos sua simpática família, menos seu filho maior, q tava tocando uma boiada p/ outra fazenda. Percebemos q éramos os únicos hospedes dali, e q essa era uma fazenda q não tinha galinhas, por causa das onças. Tb não havia nenhum cachorro, pq espantava os bichos selvagens, gdes estrelas daqui.
Nosso alojamento - um anexo das habitações dos peões - era bastante simples: um quartinho, 2 leitos e um banheiro. Marcos já avisa p/ manter a porta sempre fechada. As janelas lacradas c/ tela indicam o porque; uma infinidade de mosquitos circula por essas bandas, mesmo no calor sufocante do inicio de tarde. Aproveitamos o sol forte pra secar nossas barracas, alem de arrumar as coisas no quarto.
Marcos nos diz q o almoço ta servido. Atrás do casarão havia uma enorme sacada coberta de sapé c/ vista pro rio, onde uma mesa desfilava vários pratos com iguarias tipicamente pantaneira. Faminto, mandei ver, sem dó, experimentando de td naquele "self-service" regional: galinhada, carne seca c/ mandioca, feijoada pantaneira e muita fruta fresca a disposicao. A menos de 20m, o barrento Rio Claro (!?), passeava mansamente suas convidativas aguas, fruto das enchentes do Rio Cuiabá, q por sua vez deságua no Rio Paraguai... O cenario se completa com o canto de inúmeras e coloridas aves, q descem das copa das frondosas arvores p/ comer pedaços de melancia deixados na varanda, entre eles o cardeal (cabecinha vermelha). Proximidade e comunhao com a natureza é isso ai.
Explodindo de tanto comer, o jeito é descansar à sombra das arvores. Marcos avisa q neste horario não há muito o q fazer. E não há mesmo, o calor é insuportável tanto q ate os bichos se recolhem. Eu e o Dong aproveitamos p/ tirar um cochilo ao ar livre, sob a leve e refrescante brisa vespertina. Mas não por muito tempo, pois aqui os pernilongos estão presente ate durante o dia, e um repelente é item obrigatório. No auge do calor, teve uma hora q fiquei tentado em cair nas águas refrescantes do rio, bem na minha frente, mas tal idéia desvaneceu-se qdo vi a filhinha do Marcos trazer uma piranha recém-pescada de lá..
Depois das 15hrs, com o sol a níveis toleráveis, Marcos nos chama p/ descer o rio num pequeno bote motorizado q eles chamam de voadeira. Enquanto deslizamos suavemente rio abaixo, q vai se alargando cada vez mais e mais, permitindo ate a algumas "ilhas" de terra firme c/ vegetação, nas áreas mais elevadas. A presença de aguapés aqui é maior, e como eles filtram a água barrenta, aqui é bem mais cristalina q rio acima. As margens são cheias de mata ora abustiva ora mata alta, e nos barrancos há sempre um jacaré descansado. Tentamos nos aproximar de um, mas o bicho é tao rápido qto arisco, se enfiando na água num piscar de olhos.
As arvores rente os rios tb estão cheias de vida, principalmente na copa, onde varias aves fazem delas seu poleiro oficial. Algumas são chamadas de "condomínios", repletas de ninhos dos moradores; sao garças branca, maguary, biguás e socó-boi, entre outras q dividem harmoniosamente o espaço. O jaçanã (marronzinho) é um pássaro recorrente aqui, sempre se chafurdando na água. Os cantos das anhumas e trinca-ferros se misturam aos gritos estridentes de bugios, no meio da mata quebrando o silencio do passeio.
De repente, paramos próximos de um braço de rio (corixós, como chamam aqui) afim de pescar algumas piranhas. Seguindo dicas, colocamos as iscas e mandamos ver. Não demora e Dong pesca uma, q Marcos retira cuidadosamente do anzol p/ colocar depois num balde, pois ela mesma servira de isca posteriormente. Um puxão na minha vara faz com q, instintivamente, recolha o anzol da minha, vazio. Pescar piranha não tem segredo algum, é ate fácil. Basta saber colocar a isca no anzol p/ não dar de presente pra bichinha. Assim, logo o balde está repleta delas, algumas enormes. Curioso ver q elas, em agonia, soltavam "urros" bem baixos.. Eu, espertamente, fui tentar retirar uma do anzol, mas elas são muito escorregadias e cabou escapando da mão, encostando os afiados dentinhos no meu dedo. Outra curiosidade era perceber, na calmaria das águas, alguns momentos em q ela ficava sutilmente revolta. Marcos dizia q provavelmente cardumes das bichinhas estavam devorando algum peixe. E eu c/ a idéia de nadar ali...
Com iscas de sobra, continuamos nosso passeio. Desta vez conseguimos aproximação na margem, onde um jacarezao descansava numa boa. Marcos desligou o motor, deixando o barco deslizar lentamente em direção ao réptil, q nem sequer se mexeu. O bote encostou na margem, quase a 1 metro do jacaré, q não tirava seus olhos faiscantes da gente. Eu fiquei ate preocupado, principalmente pq era quem tava na pta do bote, e qq "rabada" do jacaré seria na minha fuça. Marcos mandou ficar calmo. Bati uma foto quase cara a cara c/ o bicho, torcendo pro bote "dar ré" o + rápido possível. Aí o bicho fez um barulho abafado e se enfiou na água p/ se perder em meio os aguapés. Ufaaaa, q susto!! Estes bichos nao caçam, apenas aguardam sorrateiros a sua presa na água, isso qdo não ficam so de boca aberta esperando um peixe cair nela (!?)
Ainda circulando pelo rio, nova pausa apenas p/ constatar a intimidade q Marcos tem com a bicharada daqui. Ele chama boa parte deles pelo nome, sabe a disposição de tal ave em tal galho e td qto é coisa. Tanto é q foi so ele pegar um teco de piranha, esticar o braço e chamar o gavião - q tava num galho , rente o rio - q o bicho não se fez de rogado, veio voando e abocanhou o petisco da mão dele! Tentei fazer o mesmo, sem sucesso, claro. Mas o q mais impressionou foi a intimidade q ele tinha com alguns jacarés q ele considerava "especiais". Uma hora ele parou o bote e começou a chamar "Ziiiicoooo, Ziiiicoooo!!". So q nada aconteceu. Disse q quiçá o tal de Zico tivesse cuidando dos filhotes. Chamou novamente. Eu tava ate cético achando q fosse historia pra boi dormir, mas foi ai q de longe vi um desses bichinhos - com os olhos fora dagua - se aproximar vagarosamente, mexendo sinuosamente a cauda sob as águas calmas do rio, silenciosamente!! Não é q era verdade? "Esse não é o Zico. É a Dorotea!", disse Marcos, como quem chama um cachorrinho. So q como ele não é bobo, desta vez ele não deu a piranha na mão e a colocou na ponta de um curto graveto. O bicho abocanhou metade do graveto junto!
O sol ia lentamente caindo enquanto subíamos o rio desta vez p/ voltar p/ fazenda. Não fazia calor mas o sol tava pegando, queimava. Refrescante era qdo encostávamos nas margens sombreadas, porem era justamente nelas q a incidência de pernilongos era maior, insuportável ate. Cruzamos com outro bote c/ turistas sentido inverso qdo fomos ver nossa ultima atração do passeio, descansando numa ilhota forrada de aguapés. Um enorme tuiuiú (jaburu), ave símbolo do pantanal q chega a ter 2,5m de envergadura, parecia indiferente a nossa presença; pelo contrario, aproximou-se mais qdo Marcos chamou ("Óóóó, Tu!! Tu, vem cá!!") e deixou visível a piranha na mão. O enorme bicho pegou, engoliu de uma vez e mandou descer pela sua inflada goela preto-avermelhada.

FOCAGEM NOTURNA

Retornamos p/ fazenda no final da tarde, todo picados, claro! Após uma refrescante ducha, nos reservamos o direito de bebericar nossa sagrada cerveja apreciando o maravilhoso por-do-sol pantaneiro, q tinge de escarlate tanto as águas como o céu, conferindo as poucas nuvens um aspecto quase surreal! O começo da noite é inundado com uma suave brisa, ainda quente. E é nesta hora q toda sorte de mosquitos, alem de pernilongos, resolvem dar as caras, principalmente em torno de focos de luz e lampiões. Briguei com o Dong pq ele tinha o habito de deixar a porta do nosso quarto aberta, pouco se lixando pros pernilongos entrando. Bem, antes mosquitos a carrapatos, a praga da estação seca.
A janta foi igualmente farta, desta vez com bandejas c/ peixes. Mojica de caixaro (pintado), porções de dourado assado e petiscos de pacu frito. Ruim são as espinhas.. Havia ate bife à cavalo. Claro q os pãezinhos e a chipa (tipo de pão de queijo) iam sorrateiramente direto p/ minha mochila. Td isso c/ arroz branco, pirão e farofa. Uma delicia.Após um breve descanso na varanda, tentando conviver harmoniosamente com os mosquitos q insistem em me picar (mesmo com repelente), vamos p/ mais uma dos programas pantaneiros, a "focagem noturna", q nada mais é q a observação de bichos de hábitos noturnos pelo entorno da fazenda, munidos de uma lanterna. Um passeio q não dura uma hora. Se tivéssemos sorte, quem sabe ate encontrássemos a Juma Maruá ou o Véio do Rio...
Desta vez a pé, seguimos Marcos (sempre munido de seu enorme facão preso à cintura, nas costas). Geralmente gdes refúgios fazem este trajeto sobre veículos tracionados, mas noss anfitrião nos diz q a pé é melhor pq não afugenta os bichos, embora seje mais perigoso. Diz q de noite é preferível ficar na fazenda a andar por ai; alem da temida onça, sao as cobras peçonhentas q resolvem dar a cara em temperaturas mais amenas. No entanto, nosso trajeto não é em mato fechado e sim pelos trilhos bem roçados e batidos. De repente, Marcos foca a mata escura e um arisco quati mergulha em meio a folhagem ao redor. Mais adiante, nos arredores dos currais onde é bem mais aberto e descampado, é direcionado um facho ao longe e distinguimos um vistoso tamanduá mediano passeando em meio o capinzal . É o bicho!! A idéia era avistar uma onça, queixada (porco-do-mato) ou anta, bichos dificílimos de ver, porem não impossível. Quiçá fosse melhor assim. Dando meia volta, já proximo do rio e caminhando em charcos, vemos famílias de capivaras descansando nas margens. Mas o mais impressionante é focar o rio em si e ver um sem-numero de "bolinhas vermelhas" brilhando em sua direção. É tudo jacaré flutuando numa boa, a menos de 20m da casa!!
Retornamos p/ fazenda satisfeitos. Eu fui fazer o trajeto de chinelo e voltei com o pé todo enlameado. Esperteza. O restante da noite foi descansando na varanda, ouvindo os inúmeros causos q Marcos tinha p/ contar, tomando seu inseparavel tereré, um mate gelado. Alias, de noite é praxe a reunião dos pantaneiros p/ um contar causos ou vantagem mesmo, q sempre tem onça, sucuri e assombração no meio.. Alguns são tão pitorescos q ate menciono: a ocasião em q apareceram gringos q queriam ver índios de qq maneira, e Marcos teve q "contratar" caboclos q se vestissem dos dito cujos e ficassem gritando em volta do chalé dos turistas; do gringo q interpretou ao pé da letra comer "bife a cavalo"; do belga q se perdeu do grupo p/ fotgrafar uma onça e cabou fotografando a bichinha comendo ele; da onça q atacou o maior touro da fazenda a noite e ninguém saiu da casa p/ ir conferir..Enfim, verdade ou não, não deixaram de ser deliciosas historias nas quais naquelas condições, com a natureza bem do lado, poderiam mto bem ter seu cunho de verdade..
A noite, o céu estreladissimo com a lua refletida na calmaria do rio seria inspiradora, não fossem os insuportáveis mosquitos e besouros q são irritantes. Não sei como a família de Marcos nem sequer se abala com eles sem repelente. O tempo passa rapidamente e la pelas 23hrs todos começam a se recolher. O dia sgte comeca cedo pro pantaneiro, e pros turistas tb. Ao ir deitar, nosso quarto ta repleto de toda sorte de bichos: alem de mosquitos, besouros andam no chão, pequenas pererecas e pálidas lagartixas estampam as paredes, enquanto mariposas e aranhas dividem o teto! Seguindo a tradição pantaneira, sempre há de se olhar abaixo da cama antes de dormir p/ ver se não há nenhuma cobra!! Cansado e me coçando todo, durmo tranqüilamente coberto ate a cabeça apenas pelo fino lençol da cama; tava quente mas os pernilongos não davam trégua.


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sangrando o rio                                                    vegetação curiosa 

CAVALGANDO PELO BANHADO

Marcos nos acordou antes do sol nascer, as 5:30. Se não fosse ele certamente seria um maldito pássaro chamado arancuã, cujo estridente chiado soava pontualmente ate q o sol chegue no ninho dele. No entanto a rotina aqui parece começar cedo p/ todo mundo: o som de pássaros em geral indica q a natureza já ta "acordada", assim como os peões desde aquela hora já iniciam suas tarefas habituais. Ate as crianças já estavam de pé, algumas já varrendo, juntando e colhendo as folhas das arvores em torno da casa.
Com repelente e protetor, embarcamos novamente na voadeira pq desta vez subiríamos o rio. A medida q deslizamos suavemente pelo rio de águas barrentas, o sol vai proporcionando uma alvorada igualmente espetacular, iluminando o céu inicialmetne com um tímido amarelo, explodir em tons vermelho-alaranjados e em seguida estampa-lo com um belo e perene azul-claro. O passeio silencioso só é quebrado pelo canto ensurdecedor das aves nas arvores das margens: são periquitos, papagaios, maritacas aos montes, assim como garças, corujas e colheireiros (pássaro cor-derosa com bico em forma de colher) q começam a descer de seus poleiros e enormes ninhos em busca de peixes ou simplesmente ficar de prontidão nos emaranhados de aguapés. Marcos nos apresenta outras aves de hábitos matinais, q se concentram nas margens ou arvores das baias de terra alagadas - isolada das margens do rio - e de nomes bem peculiares como jacutingas, íbis (curicaca), ararauna, uirapuru, saracura, irerê(marrecos) entre outros. Um enorme carandá lembra uma arvore de natal, onde os enfeites são as inúmeras garças q pipocam, cuja cor alva contrasta do verde profundo da arvore. O remexer na água indica uma arisca ariranha ou lontra, da qual vemos sometne a cabecinha submergir nos aguapés. Na época de seca, o nível das águas desce deixando varias lagoas e poças, aprisionando vários peixes q fazem a festa dos predadores. É a época ideal p/ ver bichos, pois todos ficam perto delas ou nas margens ds mesmas.
A idéia era ver uma sucuri (anaconda,) q aparentemente batia cartão no emaranhado de raízes de uma imponente arvore rente o rio, mas infelizmetne nada da dita cuja. Nada tb de uma onça q costumava deixar os restos de novilhos num determinado trecho descampado da margem. No entanto, a jacarezada tava toda onde quer se olhasse, imóvel feito pedra, mas ao menos sinal e aproximação escapulia agil feito lagartixa no meio da água. Marcos falou q o pantanal tem mais bicho q a Amazônia, pq ali é um meio-termo entre o cerrado e floresta, abrigando bichos de ambos habitats. E na Amazônia tb os bichos são + difíceis de ver pq eles se escondem, ne? Ali eles são bem visíveis.
Retornamos uma hora após apenas p/ nos fartar com o café-da-manha na mesa, ou quebra-torto, como chama aqui. Mais paes indo direto p/ mochila..Na seqüência, com sol alto, é hora de dar um passeio a cavalo pelos limites da fazenda em busca de mais bichos matinais. Meu cavalo mais parece um pônei de tão pequeno q é; o do Dong era maior devido às dimensoes de meu corpulento amigo. Marcos aconselha ir de calça mas não, meu negocio é andar de bermuda mesmo. Andar a cavalo não parece difícil: o volante é o arreio enquanto bater de leve - com os calcanhares - no bicho serve p/ acelerar. E la vamos nós.
Inicialmente voltamos pelo mesmo caminho qual chegáramos o dia anterior, mas logo quebramos pra esquerda adentrando numa planície, um cerradao descampado de capim alto q mais parece uma savana africana, encharcada, desviando de enormes cupinzeiros, alguns com quase 2m. "São altos por causa das enchentes", diz Marcos. E poe charco nisso, em alguns trechos o cavalo se enfia quase ate a barriga na água, obrigando a levantar minhas pernas, q mesmo assim saíram enlameadas. No trajeto, um carcará sobrevoa elegantemente o capim ralo e uma coruja nos vigia atentamente de cima de um cupinzeiro, em meio a gde silencio, rompido apenas pelo chapinhar dos cascos na água. Uma pausa p/ apreciar, ao longe, um veado-campeiro, uma espécie de cervo pantaneiro, pasta tranqüilamente, indiferente a nossa presença. Se Marcos não nos chama-se a atenção de sua presença, ele passaria desapercebido, pois sua coloração marrom-avermelhada se mistura à do capimzal q o envolve.
Ao cerrado alagado eles chama de "banhados", e os focos de mata maior (florestas) q aparecem como ilhas em tamanha retidão são chamadas de "cordilheiras". Após um descampadao, segue-se uma breve cordilheira, e um novo campo aberto surge à nossa frente, sucessivamente. As paisagens são quase idênticas e é muito fácil se perder. Nas cordilheiras, percebo o porquê de calças; muitos arbustos espinhentos e galhos de arvores devem ser atravessados na marra, arranhando minha perna. Ao sair de mais uma cordilheira, flagramos uma ema (espécie de avestruz menor) correndo desengonçada no capim, pra se enfiar num capão de mata proximo.
Após um bom tempo, alcançamos os limites da fazenda sinalizados por uma cerca bem simples. Agora passamos a acompanha-la p/ direita, alternando campo aberto e mata fechada, q é bem recebida devido a sua sombra refrescante. Este trecho felizmente é bem seco. O sol ta pegando. De repente, um tatu assustado remexe o capinzal ao redor, anunciando sua presença. Mais uma pausa p/ conhecer um pouco da flora pantaneira, o Genipabu e um tipo de goiabinha pantaneira, tirada do pé. Alem da palmeira típica daqui, o carandá, cujo chão esta repleto de um tipo de coquinho, bem gostoso por sinal. Há tb o mandacaru, um tipo de cacto, e o caraguatá, uma planta com espinhos vistosamente avermelhados. Ainda acompanhando o cercado, uma "batida (pegada) de onça" enorme, perfeitamente visível no meio da terra seca. Alguns ossinhos espalhados próximos de uma mata mais fechada desestimulam qq tentativa de querer atravessa-la. Marcos sugere retornarmos pelo campo de cerrado aberto, contornando a tal mata fechada. Vai saber a bichinha ta ali..a espreita, ne? Não nego q nessa hora fiquei meio tenso, pois a sensação de estar sendo observado é muito incomoda e real.

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essas vão pro bucho                            cavalgando nos banhados

QUASE INDO EMBORA

Retornamos à fazenda quase 11hrs, com sol a pino. Um descanso merecido antes do farto almoço q novamente saboreamos. Deixei de lado um caldo de piranha p/ mandar ver em algo mais consistente, como carne seca c/ mandioca, arroz tropeiro e muita salada!! Dong comeu o triplo q eu. Em seguida, mais um descanso à sombra das suntuosas arvores da fazenda, ouvindo o cantarolar dos trocentos canários e dos joao-de-barro q la pairavam. Ainda fazendo a digestão, demos uma leve caminhadinha pras casas do lado da fazenda, de propriedade da sobrinha do Marcos, as quais estavam devidamente sendo ampliadas pra futuramente se tornarem uma pousada mais incrementada q o casarão q estávamos, pros turistas mais exigentes. Numa lagoinha/brejo proximo, Marcos nos disse q ali costumava ficar uma sucuri descansando, pra alegria dos turistas. Infelismente a ausência dos mesmos deve ter desanimado a bichinha de dar as caras durante nossa estadia.
Pontualmente 2 da tarde iniciávamos a longa jornada de retorno a Cuiabá pela Transpantaneira. A viagem foi feita no mais perfeito silencio; o calor da tarde juntou-se ao cansaço das sensações vividas ate entao, proporcionando ate um improvável cochilo na incessante trepidação do veiculo. Duas hrs depois, em Poconé, uma breve pausa p/ nos refrescarmos num boteco, já indiferentes q ali é a maior bacia alagavel do Corumbá e Paraguai.

Chegamos em Cuiabá as 18:30, já com a brisa fresca típica de final de tarde, onde nos despedimos deste pantaneiro típico, cheio de causos p/ contar. Mais tarde me despediria igualmente do Dong, e dali seguiria p/ Distrito Federal aponto de curtir o reveillon na Esplanada dos Ministérios. No entanto, sair daquela região era deixar um ambiente genuinamente brasileiro. Fértil como um mar, vasto como um pais e rico como uma floresta, o Pantanal continua vivendo mansamente, regido pelo seu preciso ciclo de águas, onde apenas os peões e os bichos conseguiram se adaptar. O homem, por sua vez é minoria absoluta nesta imensidão. Imensidão e beleza q nenhuma novela é capaz de captar.

Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html