A TRAVESSIA DO PEDROSO Imprimir
Escrito por Jorge Soto   
Qui, 13 de Junho de 2013 15:25

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 Por Jorge Soto - na foto Luci Rod

Desde q conheci o fabuloso Pq Municipal Pedroso irremediavelmente me via preso a breves roteiros q iam e voltavam pelo mesmo caminho, como o da “Primeira Estação” (ou Morro do Pedroso) e o Pico Bonilha. Vai, no máximo um breve circuito, como o das ruínas da “Segunda Estação”. Nesta 4ª visita a este bucólico recanto verde de Sto André resolvi investir numa curta travessia que fosse além do q é chamado de “pto culminante do ABC”. Disso resultou um programa semi-urbanóide de meio-dia q, na diagonal, rasga td extensão do parque se valendo exclusivamente de cumes e cristas. Rolezinho simples q inicia na portaria inicial e finda no outro extremo do Pedroso, 10km a sudoeste, na favel.. ops.. comunidade do Montanhão.



O dia irrompe meio incerto, mas assim q pisamos no asfalto da Estrada do Pedroso bem adiante da portaria do pque do mesmo nome, eu e a Luzita tivemos plena certeza q aquela manhã seria permeado de apenas nebulosidade clara e atmosfera limpa, sem risco algum de  negrume maior ou qq tipo de precipitação. Eram 8:30hrs e ao invés de adentrar na portaria oficial do Pque Municipal do Pedroso nos pirulitamos pela entrada q leva em direção ao Jd Japonês. É, o tempo tava a nosso favor desta vez pois olhando pra oeste tinhamos claro contato visual com o recorte silhuetado do Morro da Torre, á diferença da vez anterior.
Cruzando a “Ponte da Amizade” e ignorando o belo pórtico oriental q dá acesso ao Jd Japonês (e á trilha das ruínas da “1ª Estação”), nossa direção toca p/ oeste, sentido um campo de futebol visível do asfalto. No final, encontramos uma corrente q barra o acesso a uma precária e antiga via calçada, mas nada q um simples desvio ou salto não resolva. Esse é o caminho q nos levará á base do Morro da Torre, na verdade, uma antiga estrada q como boa parte das vias do pque, atualmente se encontra em desuso.
Contudo, qual grata  surpresa é constatar o fato desta vereda ter sido generosamente bem e cuidadosamente roçada e não oferecer percalço algum de ser transitada! A diferença da minha última visitação, onde o mato e brejo até a canela invadiam gde parte do percurso, encontro o caminho totalmente limpo e destituído de td e qq óbstaculo! Marcas de trator no chão sugerem recente ampliação das margens da vereda de modo a facilitar a vazão dágua. Dessa forma, agora os pés q palmilham este antigo calçamento de pedra ornado de lírios-do-brejo e marias-sem-vergonha, alternando poucos trechos enlameados, conseguem a façanha de se manterem secos até o final do percurso.
Desembocamos na enorme clareira q outrora foi uma movimentada olaria da qual restam apenas vestígios de fundações concretadas por volta das 8:50hrs, onde paramos apenas pra apreciar a paisagem em volta e bater algumas fotenhas. O tom á nossa volta é predominantemente o verde da mata, da qual sempre destoam os tons rosados das onipresentes quaresmeiras. O tempo cada vez melhor nos presenteia com uma geral tanto do Morro da Torre (a oeste), o Morro do Pedroso (ao norte) e até a Segunda Estação, coroando um verdejante morro ao sul. O som de água correndo fartamente nalgum pto a nossa esquerda é constante. E não é pra menos, afinal estamos bem no meio daquela junção de vales, no centro daquele enorme anfiteatro natureba, onde td e qq vestígio do precioso liquido necessariamente é “afunilado” ate ali.
Do descampado é preciso buscar a continuidade da trilha, e ela é encontrada de forma discreta situada na extrema direita do mesmo. Mergulhamos então no frescor da floresta úmida, enxugando a vegetação q obstrui eventualmente o caminho, mas q a principio torna a pernada desimpedida de modo geral. Surge uma bifurcação onde o sentido a tomar é visivelmente o ramo da direita, rumo norte, mas eu e a Lu nos permitimos um tostão de exploração tocando pela vertente de esquerda (sul) afim de saber o q se esconde naquela direção. Resumidamente, a breve picada cruza um pequeno correguinho e logo depois desemboca num enorme descampado ao sopé do Morro da Torre. O lugar apresenta sinais de reflorestamento pela enorme qtidade de mudas espalhadas, e td leva a crer q foi dali q saiu td madeira q abasteceu a antiga olaria. Há sinais td da antiga estrada q seguia paralela áquela calçada, porém tomada em gde parte pelo mato.
Retornamos então a picada principal, agora sim começando a subir. Ganhando altitude aos poucos, nossa rota começa a desviar aos poucos pro norte, indo em direção pro selado q interliga o Morro do Pedroso e o Morro da Torre. A subida aperta mais pro final, alternando o terreno do chão em degraus de terra e um emaranhado de raizes, ou até numa larga vala erodida repleta de limo e lisa feito sabão. Neste ultimo trecho é possivel perceber o corte vertical na encosta, corroborando a hipótese de estarmos palmilhando uma antiga estrada.
Uma vez no selado reparamos q ele q não apenas interliga montanhas, mas tb divide propriedades. Uma cerca saindo pela esquerda confirma isso, já q o Morro da Torre é divisa natural do Pq Pedroso com São Bernardo do Campo. Aqui abandonamos a trilha q percorríamos, pois ela invariavelmente desce pro outro lado da serra, pro norte, sentido Condominio dos Manacás e pra Vila João Ramalho, no Bairro da Cata Preta. Imagens aéreas confirmam q por ali tb desembocaríamos nas proximidades dum lugar a atende pelo sugestivo nome de “Campos dos Drogados”. Ao invés disso, porém, tomamos o rastro q basicamente acompanha o cercado, morro acima, tocando pra sudoeste.
E assim vamos, ganhando altura morro acima e costurando a cerca ora dum lado ora doutro, conforme tiver menos vegetação no caminho. Vara-mato? Pouco. Após beijar trocentas teias-de-aranha e enxugar voçorocas de samambaias, o mato diminui de tamanho pra finalmente emergir no aberto, onde os horizontes se ampliam. Num piscar de olhos, um zunido eletrostático q envolve uma gde estrutura metálica nos dá as boas-vindas ao alto do Morro da Torre, as 9:40hrs. Numa ampla clareira com vestígios de fogueira temos um breve pit-stop p/ retomada de fôlego e alguns goles de água. Daqui observamos td extensão verdejante do Pq Pedroso, podendo conferir td nosso trajeto desde o inicio: á leste temos a panorâmica  se estendendo desde a estrutura acizentada das ruínas da “Segunda Estação” coroando um morrote, passando pelas clareiras visitadas, a vereda calçada, o Pq Japonês (ao fundo) e td crista do morrote q abriga a “Primeira Estação”, por sua vez oculta por eucaliptos perfilados; e a oeste temos a crista abaulada dos morrotes q nos restam até alcançar o Bonilha, q emerge dos demais imponentemente, no final da cadeia.
Pois bem, a partir daqui a navegação e puramente visual, o tempo esta mais q favorável e claro, não havendo duvidas com relação a q rumo tomar. Passamos então a acompanhar a crista abaulada serrana, sentido noroeste, seguindo tb os fios de alta tensão e a mesma cerca q nos guiava até então. A trilha ta bem batida, o terreno é abertamente descampado e qq capim mais alto é facilmente contornado. Ao cair na torre sgte q coroa o morrote na sequencia da crista, nossa rota desvia pro sul (acompanhando sempre a cerca) enqto as torres de alta tensão se perdem indefinidamente pro norte. Neste trecho a Lu se depara com uma cobrinha, o q a faz se munir dum pedaço de pau pra tatear o caminho desde então.
Descemos então uma suave crista a oeste, cruzamos uma simpática florestinha, um marco coberto de musgo e logo estamos no fundo vale q coroa o selado interligando os morros. Uma clareira de acampamento e uma placa louvando Deus são sinais q fervorosos fieis não so batem cartão no Bonilha como tb pernoitam nos arredores. Um tronco ostentando “Deus é Fiel” riscado na superfície corrobora esta assertiva. O silnecio é quebrado pelo alto tom duma promoção de supermercado sendo anunciada no Jd Vila Rica , q nos lembra q o quadrante norte é td dominado pela horizontalidade geométrica do ABC.
Ao subir novamente pro morro sgte caímos numa trilha bem maior, e assim o caminho torna-se intuitivo pois daqui partem outras picadas menores noutras direções. De qq forma, é necessário tomar qq vereda q vá pro sul, contornando ou cruzando o morro no qual estamos pisando. E assim desembocamos, mais acima, na base de duas torres de alta tensão doutra linha q corre paralela á anterior. Ao dar a volta do morro (oeste) temos uma bela vista de SBC, com muito capinzal dourado do morro contrastando com o cinza das construções logo abaixo, q parecem ser da Vila São Pedro, o Clube da Volks e a Favela da Biquinha. Cruzamos então uma florestinha rumo sul e tocamos pra cima do morro a antecede o Bonilha, novamente acompanhando um cercado. No alto, largas clareiras permitem visual e até acampamento bem protegido, mas a gente prossegue pela vereda, q desce suavemente pra sudoeste em meio a florestinha. Após descer cautelosamente um trecho onde a vereda se alarga recoberta de musgo terrivelmetne liso, desembocamos numa precária estrada asfaltada q deve pertencer aos proprietários do terreno q abriga o Bonilha. O último lance de trilha é aberto, íngreme e com degraus sulcados na encosta, e não tarda ao suor escorrer pelo rosto mesmo estando o dia nublado e relativamente bem fresco.
E assim, a exatas 10:45hrs finalmente pisamos nos 986,5m do pto mais alto da Região do Grande ABC, o topo do Bonilha. Diferentemente da vez anterior em q aqui estive sem visu algum, a paisagem agora exibia uma panorâmica soberba de 360 graus de td entorno: São Bernardo do Campo domina td quadrante norte, além de parte de Sto André, Mauá, Diadema e Ribeirão Pires. Com esforço, até o Pico do Jaraguá. Mas é no virar de ombros, pro sul, q a paisagem muda radicalmente do cinza pro verde, com td restante de Mata Atlântica da Serra de Paranapiacaba, assim como o lampejo da Represa Billings, com seu largo espelho dágua refletindo o céu opaco claro daquele final de manhã. No centro do pico existe uma base pequena de cimento q um dia sustentou uma enorme cruz mas q não existe mais. Por isso mesmo são justamente grupos religiosos os visitantes mais assíduos do pico, assertiva corroborada pelo fato de haver no chão restos duma Biblia e inclusive páginas da mesma chamuscadas.
Após mastigar umas barras de cereais, pão com mortadela e bebericar alguns goles dágua, retomamos a pernada. Como voltar pelo mesmo caminho naquelas ótimas condições de visibilidade tava fora de cogitação, dei uma xeretada no pedaço da carta de Itaquaquecetuba q trazia a tiracolo, avaliei com a topografia apresentada á nossa volta e dei a opção pra Lu: “Olha, nos podemos seguir pelas cristas indefinidamente pro sul e ver onde vai dar, ou daqui mesmo tocar por uma picada lateral q desce e cai na Vila São José e Jd Silvina, já em Ferrazópolis, bem aqui do lado! O que vai ser?”. Mas como a Luzita tb não queria terminar a trip de forma tão inglória qto súbita, desconsiderou imediatamente a segunda opção. Uhúúú! E vamo q vamo!
Dessa forma prosseguimos nossa andança pela sucessão de cristas abauladas rumo sul, descendo suavemente em meio ao vasto capinzal com eventuais focos de arbustos queimados e espinhentos, pra depois galgar o próximo cocoruto a nossa frente. Uma precária cerca, q as vezes some, serve de guia o tempo td. Não tem erro. A caminhada é bastante agradável e embalada em muita conversa furada, enqto o vento sopra uma brisa reffrescante em nossos rostos. Imagino q em dias ensolarados deva se tornar um inferno este programa, já q não existe sombra alguma em td trajeto.
Ao começar a descer o mais íngreme dos morros, justamente o q intercepta uma torre de alta tensão, qual nossa surpresa em encontrar um jovem passeando descalço q tb se surpreendeu conosco. Pela indumentária e serenidade de sua prosa imediatamente me pareceu ser fiel de alguma igreja local. Trocamos rapidamente informações de modo a saber se era seguro seguir em frente. “É, tocando em diante ce vai sair na favelinha Montanhão!”, ele disse mansamente, enqto um carrapitcho pendia de seu cabelo encrespado. “Vamo embora Mel, Pitanga e Blue!”, emendou. Imediatamente surgiram ariscos dois vira-latas repletos de sarna, q correram assustados em direção ao seu brisado dono, q tomou rumo o Bonilha e sumiu da nossa vista da mesma forma q apareceu. Uai, “Kd o terceiro integrante do trio animal?”, pensei com meus botões. Logo tropeçamos na trilha com um rechonchudo gato branco, cujos enormes olhos azuis justificavam seu nome e encantou a Lu. “Olha, um gato trilheiro! Que louco!”, disse ela enqto pegava o bichano no colo, td oferecido e preguiçoso.
Após muito cafuné no felino prosseguimos nossa jornada em direção ao penúltimo morro da abaulada crista, cruzando um trecho de samambaial q deixou alguns arranhões nos antebraços descobertos. Nesse meio termo eu pensava com meus botões. A palavra “Favela” ainda reverberava na minha mente e era sinônimo de possivel percalço de trip. Obstáculo urbano, claro. Falei pra Lu guardar td objeto de valor e não dar bandeira, pois sairíamos pela favela mesmo, enqto eu já mentalizava a rota alternativa pra sair o mais rapidamente dali e cair numa rodovia visível de onde estávamos. Na pior das hipóteses retornaríamos num trecho da crista onde havia uma ramificação, cuja íngreme vertente lateral levava no q parecia ser um empreendimento imobiliario.
Após o penúltimo morro restava o ultimo lance da crista, cada vez mais baixo. Dali já dava pra avistar a rodovia e a geometria inconfundível das moradias do Conjunto Selecta, cada vez mais proximas. Uai, mas kd a tal a favela? Foi ali q olhamos a nossa volta, onde pudemos avistar alguns casebres de alvenaria colados na encosta do ultimo morrote. Estavamos nos limites do Montanhão! A picada enfim desembocou num campinho de futebol de onde já não havia mais crista alguma a prosseguir. Dali em diante era o vazio inconfundível de barracos sobrepostos um sobre o outro. No entanto, o sentido a tomar era bastante intuitivo, pois bastava acompanhar o precário calçamento em meio a estreitas vielas. E assim seguir em diante, buscando sair dali o mais rápido e discretamente possivel, sem chamar muito a atenção.

Só respiramos aliviados qdo descemos uma escadaria tão sinistra como interminavel q nos deixou numa rua mais movimentada, ao pé do morro, as 11:45hrs. Dali foi num piscar de olhos q pisamos no conforto e segurança dum pto de bus, já tomando o coletivo pro centrão de Sto André. Lá desabamos num boteco ao lado da estação da CPTM, onde bebemoramos nossa pernada de menos de meio-dia. Uma travessia de cumes num serrote doméstico q descortina tanto a beleza qto contrastes inerentes de Sto André, do alto dum parque que divide o cinza urbano do verde da Mata Atlântica remanescente. E q guardadas as devidas proporções e "riscos", uma caminhada q pode muito bem ser chamada despretensiosamente de “Serra Fina do Grande ABC”.


Jorge Soto
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Última atualização ( Ter, 06 de Maio de 2014 20:12 )