A LENDÁRIA TRILHA DAS MOTOS DE PARANAPIACABA Imprimir
Seção: Trekking - Categoria: Geral
Escrito por Jorge Soto   
Qua, 26 de Outubro de 2011 17:57

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A Serra do Morrão, enorme espigão forrado de mata q se espicha no sentido sudoeste-nordeste na região serrana de Paranapiacaba, é um emaranhado de meia dúzia de trilhas “oficiais” mesclada à outro tanto deixadas por antigos carvoeiros, caçadores e palmiteiros. Entre estas primeiras, a mais conhecida é uma picada principal q dá acesso, à Pedra do Indio, Mirante, Pedra Lisa, e finalmente ao atualmente proibido Poço das Moças. Entretanto, sempre ouvi a respeito de outra trilha q corria serra abaixo, paralela à esta principal, q pra mim era nada mais q lenda, a “Trilha das Motos”. Uns diziam q sequer existia enqto outras infos davam conta q estava totalmente tomada pelo mato. Sendo assim fomos matar de vez essa curiosidade neste sabadão de tempo bom, o q resultou em mais um circuitão serrano q vence nada mais q mil metros de desnível q nasce e finda na pitoresca vila inglesa.

A escuridão total reinava no firmamento enqto o veiculo rasgava aquele final de madrugada bocejante de sexta-feira. No volante, o Mamute. Nos demais bancos eu e o Nando tentávamos mantê-lo acordado afim de passar o tempo ate chegar ao nosso destino. Mas pq chegar tão cedo? Bem, além de evitar aborrecimentos na guarita havia necessidade de otimizar ao máximo na pernada de modo a retornar a tempo em casa, pois tds tinham compromisso sábado à noite. Em tempo, pro Mamute aquele bate-volta tinha gostinho especial, pois retornava à vila inglesa após um longo hiato de 11 anos!
Chegamos em Paranapiacaba as 6:10 bem no momento em q o dia começou a raiar, onde os primeiros raios destacavam a enorme silhueta das montanhas q guardam a pacata vila. Deixamos o veiculo estacionado em frente ao Bar da Zilda, q sequer havia aberto, claro. Alias, não havia “vivalma” onde quer q se olhasse naquele comecinho de sábado frio q prometia ser de tempo bom. Mochilas de ataque nas costas, imediatamente pusemo-nos a andar rumo o portal do Pq Mun. das Nascentes, estrada acima. Após cruzar a guarita veio a famosa (e quase interminável) subida pelos paralelepípedos da Estrada da Boa Vista, q um tempo depois abandonamos em favor da famosa e bem sinalizada Trilha do Mirante. O frescor da mata naquele inicio de manha aplaca o calor gerado pelo corpo, q por sua vez se traduz na forma de algumas gotas de suor escorrendo pelo rosto.
As 6:45 emergimos no alto dos 1020m do amplo descampado q caracteriza o  famoso Mirante, onde fizemos nosso primeiro pit-stop do dia. A vista daqui é sempre espetacular e diga de nota, ainda mais  naquele comecinho de dia: os contrafortes serranos opostos represavam a nebulosidade matinal predominante na Serra de Paranapiacaba; la embaixo, o Vale do Mogi q já foi percorrido de tds as formas imagináveis (e inimagináveis) corria sinuoso ate se perder em Cubatão, já na Baixada Santista. Pausa pra fotos, claro.
Pois bem, as infos davam conta q a tal “Trilha das Motos” partia (ou terminava) de algum lugar naquele descampado, mas infelizmente não vimos sinal algum dela. So havia mesmo vestígios óbvios da famosa vereda rumo ao Poço das Moças, 1000m lá embaixo. Em contrapartida, sabíamos aproximadamente de onde partia a outra extremidade da picada visada, isto é, num sitio próximo do Poço das Moças. La pelo menos teríamos infos concretas (ou não) dessa tal “Trilha das Motos”. E foi aqui onde tanto o Mamute qto o Nando calibraram seus respectivos GPS´s apenas pra plotar o trajeto q resultaria no final do dia e ter uma noção de distancias e altitudes, principalmente.
Mergulhamos então na mata em direção ao Poço das Moças, descendo a passos rápidos a trilha íngreme (e escorregadia), alternando largos ziguezagues pela encosta e estreitas cristas com forte declividade, onde havia q se firmar na vegetação ao redor. Dessa forma não demorou a alcançar a igualmente famosa Pedra Lisa, as 7:30 e por sinal encontrava-se “mais áspera” q o normal, onde nos brindamos com mais uma rápida paradinha pra molhar a goela e apreciar o visu.
A pernada tem continuidade em suaves ziguezagues pela encosta pra depois a declividade apertar de vez no momento em q perdemos altitude por uma obvia crista, com mato caindo vertiginosamente de ambos os lados. Podemos ouvir claramente o som furioso de água correndo de ambos lados: do Córrego da Pedra Lisa à direita e o Rio Quilombo à esquerda, num fundo vale. Mas o rugido do rio é logo substituído pelas fortes pisadas no chão a medida q descemos, e não tarda pros meus joelhos começarem a reclamar em virtude do alto impacto da caminhada serra abaixo e de desnível abrupto. Q por sua vez alterna (des)escalaminhada nos 200m quase verticais q antecedem a chegada ao fundo do vale.
Enfim, alcançamos o Poço das Moças as 8:30, com os raios do Sol surgindo por sobre as montanhas ate tocar a enorme pedra onde jogamos as mochilas afim de descansar, já na cota dos aproximados 80m de altitude. Claro q o local é merecedor de um tchibum coletivo, apesar da agua estar relativamente gelada, mas e daí? Se por um lado a proibição de acesso ao Poço das Moças deixa o pessoal emburrado, ela tem seu lado positivo pois agora realmente o local já não é aquela farofa e sujeira de mais de dez anos atrás, reluzindo uma beleza bucólica impar.
Revigorados após um descanso ao sol e de beliscar nosso desjejum matinal, retomamos nossa jornada as 9:30 cheios de disposição e determinação em cumprir nosso objetivo o mais breve possivel. Atravessamos à outra margem do Quilombo com agua ate um pouco abaixo da coxa até ganhar uma picada bem pisada q acompanha o rio sentido litoral, descendo imperceptivelmente quase q nivelado em meio à mata onde tb há algumas boas clareiras pra acampar. Após cruzar alguns pequenos córregos no caminho, meia hora depois damos na famosa “Represa”, onde uma pequena muretinha de fato represa o rio num piscinão de profundidade média, ideal pra banho. Aqui tb havia uma Kombi da prefeitura com dois guardas municipais tomando conta do lugar. Imaginamos q fossem nos encher o saco mas q nada, apenas ficaram espantados ao saber q havíamos descido de Paranapiacaba em tão pouco tempo. É incrível como o pessoal ainda se espanta com quem curte trekking no mato quinem a gente. Bem, pelo menos não nos confundiram com esse outro povo “maconheiro-farofeiro” q emporcalha as trilhas e queima nosso filme.
Pois bem, é aqui onde a trilha termina e começa uma estrada de terra q acompanha o rio pela esquerda, onde logo mais adiante o atravessa mediante uma decrépita ponte pênsil. Uma vez na margem direita do Quilombo, a caminhada se mantem no mesmo compasso, tranqüila e desimpedida pela estrada de terra ate as 10:30, onde topamos com a primeira chácara da região, q conhecíamos anteriormente como “Sitio dos Cachorros” pela gde qtdade de vira-latas q anuncia nossa presença mas q na verdade de chama “Sitio Cachoeira Tumim”.
Pedindo gentilmente licença pra entrar, vamos de encontro a um senhor q no interior realizava seus afazeres matinais em busca de infos, enqto uma estridente cachorrada de pequeno porte se entusiasmava com nossa presença, com direito ate um pulguento mais assanhado com seu “batomzinho” em riste. Enfim, com o prestativo Carlos foi q finalmente tivemos esclarecimentos concretos da tal “Trilha das Motos”, q por sinal partia dali próximo. Nos contou q a picada é recente e fora aberto pelo seu pai, Seu Roberto, a quase 30 anos atrás, de modo a interligar a baixada com Paranapiacaba como alternativa mais suave e light à tradicional e feroz picada quase vertical do Poço das Moças. Antigamente o transito de gente era maior, inclusive o de motos e q acabou dando nome á vereda, ate q foram criados os Parques Estaduais e Municipais q proibiram definitivamente a transito tanto de gente como de veículos. “As motos a muito deixaram de passar mas o de gente apenas diminuiu!”, disse ele. Perguntamos das condições e nos garantiu q não tinha erro pois ele a havia roçado recentemente.
Nos despedimos do simpático senhor e ganhamos uma picada em meio ao capinzal no quintal q antes de entrar na mata passa por um córrego onde uma roda rústica dágua  gera energia pra casa do Carlos. Uma vez no frescor no bosque foi só tocar pro alto e avante. O inicio da vereda é bem batida, eventualmente sulcada pela erosão, mas obvia e bem evidente. A subida é suave e quase imperceptível ate o primeiro momento em q se faz uma curva pela encosta esquerda e na sequencia pela esquerda, largos ziguezagues q se tornarão quase q inipterruptos durante td subida da serra. Visivelmente percebemos q a picada na verdade sobe dobras de serra ate ganhar ombros serranos sucessivos, ate alcançar a crista principal q finalmente dá no alto do planalto.
Assim damos prosseguimento à nossa agradável ascenção em meio àquela bucólica florestinha q filtra os raios solares das 11hrs, cruzamos com alguns pequenos córregos e desviamos de alguma mata caída sem mta dificuldade. A picada se alarga e se estreita em varias ocasiões, mas incrivelmente a boa condição dela nos surpreende pois esperávamos q fossemos ter mais dificuldade e lançar mão inclusive de varação de mato, o q felizmente não foi necessário. Neste aspecto ela lembrou muito a “Trilha do Padre” (no Vale do Mogi) so q com menos declividade.
Dessa forma compassada e sem desgaste algum fomos ganhando altitude rápida e imperceptivelmente, sempre serpenteando a encosta morro acima e costurando largos ombros serranos sucessivos, onde as vezes a picada estreitava-se de tal forma q nos deixava á beira de uma piramba quase vertical, à nossa esquerda. Mas logo ela costurava pra direita q td recomeçava novamente, ganhando mais alguns metros num piscar de olhos a medida q engolíamos as teias de aranha q se interpunham no caminho, denunciando esporádico desuso da vereda.
Na cota dos 550m a vereda aparentou nivelar durante um bom tempo, se mantendo sempre pela encosta direta da montanha. Eventuais frestas na mata emolduravam a paisagem á nossa volta, composta de montanhas verdejantes despencando abruptamente pro vale ao lado. Mas ao meio-dia, mais precisamente na cota dos 650m, fizemos um breve parada pra descanso ao sopé de duas enormes rochas e próximo de uma bem-vinda bica despejando sua água cristalina pronta pra refrescar nossa goela.
Retomamos a gostosa caminhada agora atraves de pedras roladas forradas por um musgo verde q lembra mto um calçamento colonial, passamos pelo q restou de alguma construção pois o único q sobrou intacto é um antigo e improvavel tanque (!?). Mas não tarda a começarmos a alternar as encostas com frequencia maior, costurando a larga crista com mais rapidez, onde muitos atalhos surgem no caminho cortando os ziguezagues diretamente pra cima.
Na altura dos 720m chama-nos a atenção a presença de uma frutinha em abundancia no chão. O Mamute corajosamente experimenta e diz ser uma espécie miniatura de maracujá-silvestre, saborosamente azedo. Ainda subindo, 100m acima a pernada suaviza novamente mas a presença de muitas arvores, bambus e td sorte de mata tombada retarda nosso avanço, porem sem gdes intercedencias. Mas é somente aos 900m q a subida aperta um pouco, onde visivelmente reparamos a crista se estreitando cada vez mais e mais, assim como a vegetação a nossa volta diminuir em tamanho e qtidade.
Enfim, já percebendo q não havia mais o q subir, eis q as 13:10hrs emergimos no alto dos 1020m do Mirante!! Sim, aquele mesmo q haviamos estado 6hrs atrás! Foi ai q vimos onde a trilha chegava, mais precisamente num alto capinzal bem do lado de um bloco de concreto, a quase uns 20m à direita da trilha q desce pro Poço das Mocas, meio q escondida na vegetação. Pois é, o começo da “Trilha das Motos” aqui não ta tão evidente devido ao alto capim ocultando sua entrada. Enfim, no Mirante, mas à diferença daquela manhã cênica agora não há visual nenhum por conta da espessa nebulosidade tingindo td em volta de cinza e opaco.
Após descansar um pouco e terminar com os últimos goles de agua de nossas garrafas, retomamos o caminho de volta ate q as 13:30 já estavamos pisando nos paralelepípedos da Estrada de Boa Vista, doidos pra chegar na vila. Ao passar pela guarita do parque apenas acenamos cordialmente pro guardinha q agora nela havia, mas q mal piscou o olho pra gente pois devia estar tirando aquele gostoso cochilo pós-almoço.
Chegamos no centro de Paranapiacaba somente as 14hrs, trocamos as vestes úmidas de suor por outras secas e mais aconchegantes e estacionamos no Largo dos Padeiros, onde mandamos ver 4 cervejas, uma pinga de Cambuci e vários salgados pra rebater a larica. Se tivéssemos combinado não teria dado certo pois mal chegamos ali q um denso nevoeiro abraçou a vila, um negrume tomou conta dos céus e uma chuva torrencial desabou interminavelmente!!! Ufaaa, ainda bem!!! O frio logo se fez sentir, mas ate la já estavamos anestesiados pelo álcool da pinga, q por sinal estava deliciosa. Mas como a mistura pinga e cerveja costuma ser meio q fatal conforme a qtdade ingerida, claro q um integrante do nosso intrépido trio (q prefiro não mencionar o nome, mas não era eu nem o motora) saiu literalmente trançando as pernas a pto de quase perder seus pertences no veiculo.

Voltamos pra “paulicéia desvairada” algumas horas depois, felizmente a tempo de saldar nossos respectivos compromissos de sábado á noite. Contentes, claro. Afinal haviamos tirado a limpo q a “Trilha das Motos” era real e por sinal bem batida. Longe de ser lenda, ela oferece uma alternativa bem tranqüila, de baixo impacto aos joelhos e não tão desgastante de acesso ao planalto, ideal pra iniciantes em caminhadas ou trilheiros menos condicionados. Mas a picada tb vislumbra novas rotas pra outras direções da Serra do Morrão, principalmente pelos vários cursos dágua q descem por suas encostas com tentadoras subidas selvagens de rio, entre outras possibilidades. Dessa forma, a pacata Paranapiacaba sempre irá manter inabalada sua vocação especial pra aventura.


Jorge Soto
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