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MOCHILANDO NA TRANSPANTANEIRA - Página 2 PDF Imprimir E-mail
Seção: Técnicas - Categoria: Lateral
Escrito por Jorge Soto   
Qui, 04 de Junho de 2009 21:56
Índice do Artigo
MOCHILANDO NA TRANSPANTANEIRA
ENTRE JACARÉS E PIRANHAS
QUASE INDO EMBORA
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Jaburú                                                       Piranho e Piranha

ENTRE JACARÉS E PIRANHAS (O PEIXE)

Aqui deixamos a Kombi onde 2 outros peões nos aguardavam a cavalo, pois a partir dali a estradinha tava um atoleiro só. Eu e o Dong montamos nossos cavalos, enquanto os peões levavam nossas mochilas numa carroça. Nunca tive jeito p/ cavalos mas aqui (re)descobri q montar não é tão difícil assim. O dose foi ver q o bichinho tava cheio de feridas provocadas por um moscão hematofago, deixando varias marcas de sangue coagulado no dorso. Era quase meio-dia.
Menos de meia-hora depois já nos encontrávamos propriamente na Fazenda Rio Claro, um casarão bem simples cercado das casas dos peões, às margens do rio homonimo. O pantaneiro é um tipo de vaqueiro, peão, q toca o gado p/ áreas de pastagens de acordo como regime das cheias. Atualmente, alem do gado, se incumbem de adaptar as fazendas a receber turistas, atividade rentável p/ eles. No caso, Marcos era o "pantaneiro-mor", tocava a fazenda na ausência do dono. No casarão, conehcemos sua simpática família, menos seu filho maior, q tava tocando uma boiada p/ outra fazenda. Percebemos q éramos os únicos hospedes dali, e q essa era uma fazenda q não tinha galinhas, por causa das onças. Tb não havia nenhum cachorro, pq espantava os bichos selvagens, gdes estrelas daqui.
Nosso alojamento - um anexo das habitações dos peões - era bastante simples: um quartinho, 2 leitos e um banheiro. Marcos já avisa p/ manter a porta sempre fechada. As janelas lacradas c/ tela indicam o porque; uma infinidade de mosquitos circula por essas bandas, mesmo no calor sufocante do inicio de tarde. Aproveitamos o sol forte pra secar nossas barracas, alem de arrumar as coisas no quarto.
Marcos nos diz q o almoço ta servido. Atrás do casarão havia uma enorme sacada coberta de sapé c/ vista pro rio, onde uma mesa desfilava vários pratos com iguarias tipicamente pantaneira. Faminto, mandei ver, sem dó, experimentando de td naquele "self-service" regional: galinhada, carne seca c/ mandioca, feijoada pantaneira e muita fruta fresca a disposicao. A menos de 20m, o barrento Rio Claro (!?), passeava mansamente suas convidativas aguas, fruto das enchentes do Rio Cuiabá, q por sua vez deságua no Rio Paraguai... O cenario se completa com o canto de inúmeras e coloridas aves, q descem das copa das frondosas arvores p/ comer pedaços de melancia deixados na varanda, entre eles o cardeal (cabecinha vermelha). Proximidade e comunhao com a natureza é isso ai.
Explodindo de tanto comer, o jeito é descansar à sombra das arvores. Marcos avisa q neste horario não há muito o q fazer. E não há mesmo, o calor é insuportável tanto q ate os bichos se recolhem. Eu e o Dong aproveitamos p/ tirar um cochilo ao ar livre, sob a leve e refrescante brisa vespertina. Mas não por muito tempo, pois aqui os pernilongos estão presente ate durante o dia, e um repelente é item obrigatório. No auge do calor, teve uma hora q fiquei tentado em cair nas águas refrescantes do rio, bem na minha frente, mas tal idéia desvaneceu-se qdo vi a filhinha do Marcos trazer uma piranha recém-pescada de lá..
Depois das 15hrs, com o sol a níveis toleráveis, Marcos nos chama p/ descer o rio num pequeno bote motorizado q eles chamam de voadeira. Enquanto deslizamos suavemente rio abaixo, q vai se alargando cada vez mais e mais, permitindo ate a algumas "ilhas" de terra firme c/ vegetação, nas áreas mais elevadas. A presença de aguapés aqui é maior, e como eles filtram a água barrenta, aqui é bem mais cristalina q rio acima. As margens são cheias de mata ora abustiva ora mata alta, e nos barrancos há sempre um jacaré descansado. Tentamos nos aproximar de um, mas o bicho é tao rápido qto arisco, se enfiando na água num piscar de olhos.
As arvores rente os rios tb estão cheias de vida, principalmente na copa, onde varias aves fazem delas seu poleiro oficial. Algumas são chamadas de "condomínios", repletas de ninhos dos moradores; sao garças branca, maguary, biguás e socó-boi, entre outras q dividem harmoniosamente o espaço. O jaçanã (marronzinho) é um pássaro recorrente aqui, sempre se chafurdando na água. Os cantos das anhumas e trinca-ferros se misturam aos gritos estridentes de bugios, no meio da mata quebrando o silencio do passeio.
De repente, paramos próximos de um braço de rio (corixós, como chamam aqui) afim de pescar algumas piranhas. Seguindo dicas, colocamos as iscas e mandamos ver. Não demora e Dong pesca uma, q Marcos retira cuidadosamente do anzol p/ colocar depois num balde, pois ela mesma servira de isca posteriormente. Um puxão na minha vara faz com q, instintivamente, recolha o anzol da minha, vazio. Pescar piranha não tem segredo algum, é ate fácil. Basta saber colocar a isca no anzol p/ não dar de presente pra bichinha. Assim, logo o balde está repleta delas, algumas enormes. Curioso ver q elas, em agonia, soltavam "urros" bem baixos.. Eu, espertamente, fui tentar retirar uma do anzol, mas elas são muito escorregadias e cabou escapando da mão, encostando os afiados dentinhos no meu dedo. Outra curiosidade era perceber, na calmaria das águas, alguns momentos em q ela ficava sutilmente revolta. Marcos dizia q provavelmente cardumes das bichinhas estavam devorando algum peixe. E eu c/ a idéia de nadar ali...
Com iscas de sobra, continuamos nosso passeio. Desta vez conseguimos aproximação na margem, onde um jacarezao descansava numa boa. Marcos desligou o motor, deixando o barco deslizar lentamente em direção ao réptil, q nem sequer se mexeu. O bote encostou na margem, quase a 1 metro do jacaré, q não tirava seus olhos faiscantes da gente. Eu fiquei ate preocupado, principalmente pq era quem tava na pta do bote, e qq "rabada" do jacaré seria na minha fuça. Marcos mandou ficar calmo. Bati uma foto quase cara a cara c/ o bicho, torcendo pro bote "dar ré" o + rápido possível. Aí o bicho fez um barulho abafado e se enfiou na água p/ se perder em meio os aguapés. Ufaaaa, q susto!! Estes bichos nao caçam, apenas aguardam sorrateiros a sua presa na água, isso qdo não ficam so de boca aberta esperando um peixe cair nela (!?)
Ainda circulando pelo rio, nova pausa apenas p/ constatar a intimidade q Marcos tem com a bicharada daqui. Ele chama boa parte deles pelo nome, sabe a disposição de tal ave em tal galho e td qto é coisa. Tanto é q foi so ele pegar um teco de piranha, esticar o braço e chamar o gavião - q tava num galho , rente o rio - q o bicho não se fez de rogado, veio voando e abocanhou o petisco da mão dele! Tentei fazer o mesmo, sem sucesso, claro. Mas o q mais impressionou foi a intimidade q ele tinha com alguns jacarés q ele considerava "especiais". Uma hora ele parou o bote e começou a chamar "Ziiiicoooo, Ziiiicoooo!!". So q nada aconteceu. Disse q quiçá o tal de Zico tivesse cuidando dos filhotes. Chamou novamente. Eu tava ate cético achando q fosse historia pra boi dormir, mas foi ai q de longe vi um desses bichinhos - com os olhos fora dagua - se aproximar vagarosamente, mexendo sinuosamente a cauda sob as águas calmas do rio, silenciosamente!! Não é q era verdade? "Esse não é o Zico. É a Dorotea!", disse Marcos, como quem chama um cachorrinho. So q como ele não é bobo, desta vez ele não deu a piranha na mão e a colocou na ponta de um curto graveto. O bicho abocanhou metade do graveto junto!
O sol ia lentamente caindo enquanto subíamos o rio desta vez p/ voltar p/ fazenda. Não fazia calor mas o sol tava pegando, queimava. Refrescante era qdo encostávamos nas margens sombreadas, porem era justamente nelas q a incidência de pernilongos era maior, insuportável ate. Cruzamos com outro bote c/ turistas sentido inverso qdo fomos ver nossa ultima atração do passeio, descansando numa ilhota forrada de aguapés. Um enorme tuiuiú (jaburu), ave símbolo do pantanal q chega a ter 2,5m de envergadura, parecia indiferente a nossa presença; pelo contrario, aproximou-se mais qdo Marcos chamou ("Óóóó, Tu!! Tu, vem cá!!") e deixou visível a piranha na mão. O enorme bicho pegou, engoliu de uma vez e mandou descer pela sua inflada goela preto-avermelhada.

FOCAGEM NOTURNA

Retornamos p/ fazenda no final da tarde, todo picados, claro! Após uma refrescante ducha, nos reservamos o direito de bebericar nossa sagrada cerveja apreciando o maravilhoso por-do-sol pantaneiro, q tinge de escarlate tanto as águas como o céu, conferindo as poucas nuvens um aspecto quase surreal! O começo da noite é inundado com uma suave brisa, ainda quente. E é nesta hora q toda sorte de mosquitos, alem de pernilongos, resolvem dar as caras, principalmente em torno de focos de luz e lampiões. Briguei com o Dong pq ele tinha o habito de deixar a porta do nosso quarto aberta, pouco se lixando pros pernilongos entrando. Bem, antes mosquitos a carrapatos, a praga da estação seca.
A janta foi igualmente farta, desta vez com bandejas c/ peixes. Mojica de caixaro (pintado), porções de dourado assado e petiscos de pacu frito. Ruim são as espinhas.. Havia ate bife à cavalo. Claro q os pãezinhos e a chipa (tipo de pão de queijo) iam sorrateiramente direto p/ minha mochila. Td isso c/ arroz branco, pirão e farofa. Uma delicia.Após um breve descanso na varanda, tentando conviver harmoniosamente com os mosquitos q insistem em me picar (mesmo com repelente), vamos p/ mais uma dos programas pantaneiros, a "focagem noturna", q nada mais é q a observação de bichos de hábitos noturnos pelo entorno da fazenda, munidos de uma lanterna. Um passeio q não dura uma hora. Se tivéssemos sorte, quem sabe ate encontrássemos a Juma Maruá ou o Véio do Rio...
Desta vez a pé, seguimos Marcos (sempre munido de seu enorme facão preso à cintura, nas costas). Geralmente gdes refúgios fazem este trajeto sobre veículos tracionados, mas noss anfitrião nos diz q a pé é melhor pq não afugenta os bichos, embora seje mais perigoso. Diz q de noite é preferível ficar na fazenda a andar por ai; alem da temida onça, sao as cobras peçonhentas q resolvem dar a cara em temperaturas mais amenas. No entanto, nosso trajeto não é em mato fechado e sim pelos trilhos bem roçados e batidos. De repente, Marcos foca a mata escura e um arisco quati mergulha em meio a folhagem ao redor. Mais adiante, nos arredores dos currais onde é bem mais aberto e descampado, é direcionado um facho ao longe e distinguimos um vistoso tamanduá mediano passeando em meio o capinzal . É o bicho!! A idéia era avistar uma onça, queixada (porco-do-mato) ou anta, bichos dificílimos de ver, porem não impossível. Quiçá fosse melhor assim. Dando meia volta, já proximo do rio e caminhando em charcos, vemos famílias de capivaras descansando nas margens. Mas o mais impressionante é focar o rio em si e ver um sem-numero de "bolinhas vermelhas" brilhando em sua direção. É tudo jacaré flutuando numa boa, a menos de 20m da casa!!
Retornamos p/ fazenda satisfeitos. Eu fui fazer o trajeto de chinelo e voltei com o pé todo enlameado. Esperteza. O restante da noite foi descansando na varanda, ouvindo os inúmeros causos q Marcos tinha p/ contar, tomando seu inseparavel tereré, um mate gelado. Alias, de noite é praxe a reunião dos pantaneiros p/ um contar causos ou vantagem mesmo, q sempre tem onça, sucuri e assombração no meio.. Alguns são tão pitorescos q ate menciono: a ocasião em q apareceram gringos q queriam ver índios de qq maneira, e Marcos teve q "contratar" caboclos q se vestissem dos dito cujos e ficassem gritando em volta do chalé dos turistas; do gringo q interpretou ao pé da letra comer "bife a cavalo"; do belga q se perdeu do grupo p/ fotgrafar uma onça e cabou fotografando a bichinha comendo ele; da onça q atacou o maior touro da fazenda a noite e ninguém saiu da casa p/ ir conferir..Enfim, verdade ou não, não deixaram de ser deliciosas historias nas quais naquelas condições, com a natureza bem do lado, poderiam mto bem ter seu cunho de verdade..
A noite, o céu estreladissimo com a lua refletida na calmaria do rio seria inspiradora, não fossem os insuportáveis mosquitos e besouros q são irritantes. Não sei como a família de Marcos nem sequer se abala com eles sem repelente. O tempo passa rapidamente e la pelas 23hrs todos começam a se recolher. O dia sgte comeca cedo pro pantaneiro, e pros turistas tb. Ao ir deitar, nosso quarto ta repleto de toda sorte de bichos: alem de mosquitos, besouros andam no chão, pequenas pererecas e pálidas lagartixas estampam as paredes, enquanto mariposas e aranhas dividem o teto! Seguindo a tradição pantaneira, sempre há de se olhar abaixo da cama antes de dormir p/ ver se não há nenhuma cobra!! Cansado e me coçando todo, durmo tranqüilamente coberto ate a cabeça apenas pelo fino lençol da cama; tava quente mas os pernilongos não davam trégua.



 
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